segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Diálogo no Ensino Religioso


O diálogo entre fés diversas visa a desconstruir ódios e preconceitos e a construir o respeito aos outros buscando a fraternidade. A proposta de um diálogo no ensino religioso é necessária porque há em nosso povo grande diversidade de manifestações religiosas. Esta forma de diálogo chama-se diálogo inter-religioso e contempla várias tradições religiosas. Esse tema tem sido debatido em diversos seminários, congressos e simpósios realizados no Brasil. Esse pluralismo religioso, existente no Brasil e também no mundo, requer o conhecimento dos diversos contextos sócio históricos e do multiculturalismo. Neste sentido as condições para melhor conhecimento e reconhecimento das diversidades culturais estão relacionadas ao pluralismo religioso. Em certo sentido para determinada cultura há uma interpretação religiosa e mesmo numa cultura há uma diversidade de religiões.
Tal diversidade constitui uma riqueza, em termos de conhecimentos, e pode proporcionar ao ensino religioso relevantes fontes de pesquisa, como disciplina. Certamente o primeiro passo para um diálogo efetivo das religiões é o conhecimento. Só se respeita o que se conhece, sendo assim é necessário conhecer as religiões dos outros. Um dos exemplos bem interessantes é o grande crescimento das comunidades neopentecostais – Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da Graça e outras – que buscam nas tradições e cultura populares as suas manifestações religiosas. Outro exemplo que existe na realidade de Roraima são as manifestações religiosas dos indígenas, em especial o Aleluia (O Aleluia é uma manifestação religiosa cristã, com seu provável início no século XIX, que tem por adeptos indígenas da região da fronteira do Brasil com a Guiana). O conceito de diversidade religiosa na visão das ciências da religião procura entender os aspectos multidisciplinares focadas no diálogo. Para melhor entendimento deste diálogo que vem acontecendo entre diversas religiões e que seus debates vêm aprofundando ainda mais a sua prática. Não há como negar que estas relações devem estar presentes na formação e orientação que os alunos recebem sobre o ensino religioso.
Nesta proposta dialógica o importante é fazer a superação dos preconceitos em relação às outras tradições religiosas. Entende-se que todas as religiões têm algo a ensinar. Mesmo que se discorde de algumas propostas religiosas, deve-se observar o que há de comum entre elas. Na relação existente entre católicos e judeus acontecem assembleias nacionais do diálogo e chega acontecer celebrações inter-religiosas, que mesmo na diversidade passam a valorizar muito mais aspectos comuns de suas religiões. O mesmo vem acontecendo com cristãos de denominações diferentes.
Há falta grave em relação à compreensão e entendimento sobre o significado das religiões afro-brasileiras. Todas as tradições, incluindo as religiões afro, tem que ser consideradas numa proposta em que o que se deve é estabelecer uma relação mais profunda com o conhecimento destas religiões e que observe seus valores em suas características. A promoção de um ensino religioso plural exige observação de fés diversas, numa perspectiva solidária na busca do sagrado. No ensino religioso exige-se ainda uma concepção multidisciplinar que visa a elaborar propostas científicas na busca do conhecimento desta área.
A concepção multidisciplinar no estudo das religiões conceberá, além das disciplinas das ciências humanas, as dimensões da religiosidade humana, suas culturas, vistas em seus diferentes aspectos e sua diversidade de gênero e etnia. O direito de crença e culto se fortalecerá no ensino religioso, buscando a tolerância entre diversos grupos raciais (Cf. CARNIATO, 2010, p. 7).
Na relação entre os conceitos e o entendimento do fenômeno religioso como um patrimônio imaterial pode-se observar os conteúdos de cada tradição religiosa nas perspectivas que Carniato nos propõe:
    Ritos, festas, locais sagrados, símbolos – centros religiosos, templos, igrejas, sinagogas, mesquitas, terreiros, casas de reza, centros de cerimônias, oferendas, cultos, liturgias, rituais etc.
    Tradições religiosas – indígenas, africanas e afro-brasileiras, Judaísmo, Xintoísmo, Hinduísmo, Budismo, Islamismo, Fé Bahá'i, Protestantismo, Catolicismo, Pentecostalismo, novos movimentos religiosos ecléticos e sincréticos, religião cigana e outras.
    Teologias das tradições religiosas – diferentes nomes e atributos do ser transcendente, diferenças e semelhantes doutrinais entre as tradições religiosas; mitos de origem, crenças na imortalidade; ancestralidade, reencarnação, ressurreição.
    Textos sagrados – orais: mitos e cosmovisões das tradições indígenas, ciganas, africanas; escritos: livros sagrados das antigas civilizações e das tradições religiosas atuais.
    Ethos dos povos e das culturas – costumes e valores dos povos e de suas religiões. (CARNIATO, 2010, p. 10).
Desta forma entende-se que o ensino religioso proporcionaria conhecimentos necessários para uma formação ampla sólida e na relação com o diálogo.
Dentro deste contexto pode-se entender que a educação religiosa pluralista, isto é, que conceba as diversas tradições religiosas e não somente uma, “é necessário que a escola se compreenda como um projeto aberto, promotor de uma cultura de diálogo e comunicação entre grupos sociais e religiosos que compõem a comunidade a que servem” (JUNQUEIRA, p. 49).
A diversidade religiosa requer apoio à laicidade do ensino religioso, isto significa que podem ser respeitadas todas as tradições religiosas. Deve-se evitar o privilegio a qualquer confissão religiosa ou o uso do proselitismo em seus conteúdos e de prática em sala de aula, conforme o artigo 33 da LDB (BRASIL, 2012). Fora deste contexto a liberdade religiosa fica ameaçada, como afirma Debora Diniz ao referir-se ao confessionalismo adotado no Estado do Rio de Janeiro: “Quanto mais confessional for a regulamentação dos Estados, quanto mais os concurso públicos forem como o do Rio […], maior é a ameaça. A liberdade religiosa no País e a justiça religiosa também.” (apud AZEVEDO, p. 2).
Em relação à elaboração de caminhos alternativos para a identificação de elementos religiosos indígenas, especialmente os que se manifestam através de sua riqueza cultural, será necessário na medida em que as escolas indígenas tornam-se específicas. Na mesma medida e em maior escala também em relação à religiosidade Afro-brasileira. As especificidades das manifestações religiosas afro e indígena constituem focos culturais de interação com a natureza. Correto seria que tal riqueza se incluísse nos planos e currículos do ensino religioso em nossas escolas.
Deve-se superar a condição de que a cor no Brasil é algo de corpo presente: Existe, no entanto não há reconhecimento. E por outro lado não há esforço de que tal reconhecimento tenha visibilidade, assim como relata Wilma Coelho, ao discorrer sobre as relações raciais entre professoras no Pará. Para ela a questão da cor é uma instituição ausente no Brasil porque a cor aparece pouco – em meios de comunicação, jornais e revistas – e a condição do mestiço, com raízes africana, está ausente como discussão aberta na formação de professores. (COELHO, 2007, p. 40).
Tal realidade se torna ainda crítica em relação à condição dos povos indígenas, partindo do princípio de que a principal forma identitária destes povos estão intimamente relacionadas às suas terras. Os “indiodescendentes”, assim como os afrodescendentes, esquecidos à sua própria sorte do ponto de vista educacional enfrentam situações racistas, discriminatórias em relação à sua condição de cor, sua cultura e manifestações religiosas.
A partir destas manifestações religiosas e outras, professadas pelos crentes, o ensino religioso deverá inserir-se no contexto do diálogo, com uma disposição aberta para acolher a todos em suas confissões religiosas. Ter-se-á possibilidades de buscar a paz e o entendimento, e da compreensão de um conceito de religião que ultrapassa as barreiras das hierarquias, agrupando toda manifestação religiosa e encontrar o que há de comum para melhor aproximação.

REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Solange, A liberdade religiosa está ameaçada no país, Isto é, São Paulo, Ed. 2164, p. 1-3, 29 abr. 2011.

BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm>, acesso em 8 jul. 2012.

CARNIATO, Maria Inês. Diversidade religiosa no mundo atual. Livro do Professor. São Paulo: Paulinas, 2010.

COELHO, Wilma Nazaré Baía. de corpo presente: o silêncio tácito sobre cor e relações raciais na formação de professoras no estado do Pará. Rev. Bras. Educ. [online]. 2007, vol.12, n.34, pp. 39-56.

JUNQUEIRA, A presença do ensino religioso no contexto da educação, in: JUNQUEIRA, Sérgio(org.), WAGNER, Raul (org.). O ensino religioso no Brasil, Curitiba, Champagnat, 2011.

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